O que quebrou/quebra as empresas menores?

O que é ter uma empresa?

Acho que para essa discussão, primeiro precisamos definir o que é ter uma empresa.
Na minha visão, um motorista de Uber por mais que tenha um CNPJ, ele não tem uma empresa.

Da mesma forma não são empresas programadores que tem CNPJ mas:

• Trabalham apenas para um contratante que lhes consomem todo o tempo;
• O contratante define as regras de trabalho;
• Ditam as regras de horário, local e comportamento;
• Não possuem funcionários e todo trabalho é realizado pelo próprio programador.

Atenção, não há nada de errado em trabalhar das formas que citei acima, apenas que não se tratam de empresas, outras empresas tradicionais também não vão te enxergar na prática como empresa apenas por ter um CNPJ.

Uma empresa precisa ter a possibilidade de escala e vazão, seja de produtos ou serviços, no caso da maioria de nós aqui nessa comunidade se trata de serviços de desenvolvimento (software houses) ou de produtos como SaaS. E para escalar isso são necessários programadores (funcionários, parceiros, terceirizados...), e para dar vazão precisamos de vendedores. É isso que na minha visão define o que é uma empresa.

Minha experiência até aqui

Minha empresa não quebrou, mas foi quase, passamos por momentos complicados. Eu atribuo a culpa na falta de preparo em gestão/administração da minha parte.

Nós programadores, acreditamos que ao desenvolver o melhor software que resolve um problema X da melhor forma possível nossa empresa será um sucesso. E quando chegamos em um momento da nossa carreira, achamos que somos bons tecnicamente para fazer isso acontecer, abrimos a empresa e percebemos que no mundo real não é assim.

Para quem é programador e pensa em empreender, minha dica é passar um bom tempo estudando gestão de empresas com a mesma dedicação que estuda suas tecnologias favoritas, certamente isso vai evitar muitos tropeços.

Outros pontos importantes, que muito programador aspirante a empreendedor não se dá conta:

• Ao empreender, você vai ter que deixar de ser programador, você pode até estar nessa posição no começo da jornada, mas se quiser que a empresa progrida você não pode ser funcionário da sua própria empresa na principal atividade dela, você tem que ser o gestor.
• O time de desenvolvimento é muito importante, mas o time de vendas é mais importante ainda. Sem um time de vendas, mesmo que terceirizado, sua empresa não vai durar muito.
• Aprenda a delegar, se não delegar responsabilidades e passar a centralizar tudo em você, em pouco tempo você se tornará o gargalo da empresa. Mas atenção, aqui fica aquela dica de tiozão: delegar não é deLARGAR.
• Métricas, sabe aquelas métricas e observabilidade que adicionamos em nossos softwares. Precisamos de métricas também da empresa para tudo que for importante: finanças, entregas dos times de vendas, entregas dos times de desenvolvimento e suporte por exemplo.
• Aprenda precificar, muita empresa quebra por não saber precificar corretamente o produto ou serviço, é capaz até de estar com margem negativa e nem saber disso. Já vi empresa que não calculava os impostos como custos, apenas os pagava na emissão da NF e o que era para ser uns 30% de lucro na realidade eram 19,5%.
• Tente criar uma empresa que você gostaria de trabalhar, mesmo se estivesse no cargo mais baixo. Ou seja, imagine a empresa que seria ideal para você quando você era apenas um "programador juninho inocente nessa vida", tente fazer com que sua empresa seja desse jeito imaginado para os júnior do seus times de desenvolvimento. Vai ser difícil, mas foque em criar um ambiente legal.

Empreender não é para todo mundo

É importante destacar que nem todo mundo está preparado para empreender, e talvez nem queira isso. E tá tudo bem, nem todo mundo precisa ser dono de uma empresa.

Mas é importante saber que apenas como programador trabalhando para alguém, é quase certo que você terá uma vida confortável financeiramente, mas não será rico (se esse for seu objetivo de vida). São raríssimos os casos de alguém que ficou realmente rico sendo apenas programador, acho que isso vale para quase todas as profissões como advogados, médicos, engenheiros...

Estranhamente um dos principais problemas ninguém falou:

Falta de conhecimento em contabilidade: esse erro cconsiste em calcular lucro pela receita operacional, muita gente cai na lábia que existe o tal "lucro 100%" porque matematicamente existe, mas quando se fala de empresa, você joga com as regras da contabilidade, e em contabilidade isso não existe, por exemplo vamos supor que um produto custa 15 reais para você ter ele e você vende por 30, tem gente que faz assim:

O problema é que isso leva a um erro fatal, considerando que você DEVE dividir o lucro por 3:

• 33% vai pra empresa
• 33% vai para a reserva de emergencia da empresa
• 33% para a divisão societária

Como você calculou pela margem bruta fica:

• R$ 10,00 vai pra empresa
• R$ 10,00 vai para a reserva de emergencia da empresa
• R$ 10,00 para a divisão societária

Considerando que você vai ter que pagar os custos (R$ 15) que teve para conseguir ter o produto/serviço disponível, isso significa que uma das contas vai ficar zerada e outra vai sofrer, ou você ainda pode dividir 15 por 3 e deduzir denovo nas contas, como geralmente as pessoas não se atentam que o melhor nesse caso é a última opção, geralmente fazem assim:

• R$ 5,00 vai pra empresa
• R$ 0,00 vai para a reserva de emergencia da empresa
• R$ 10,00 para a divisão societária

E meus parabéns, basta ter uma pequena perturbação no mercado para a sua empresa ser forçada a cortar custos, agora que você aprendeu o jeito errado, o certo, calculando pelo custo ou margem liquida:

Fazendo a mesma coisa de dividir por 3:

• R$ 5,00 vai pra empresa
• R$ 5,00 vai para a reserva de emergencia da empresa
• R$ 5,00 para a divisão societária

Perceba que fazendo pelo lucro contábil ou líquido, fica impossível errar a conta e você ganha resiliência em flutuações de mercado lembrando que essa divisão por 3 é para quem tá começando justamente para fazer uma reserva de emergencia ao mesmo tempo que permite viver do negócio, quando a empresa sai do risco operacional, ou seja quando você conseguir se estruturar entra geralmente a seguinte regra, o objetivo é se expandir e começar a competir de verdade no mercado ao mesmo tempo que se prepara para uma crise ou queimar caixa com marketing e subsidiação:

• 44% vai pra empresa
• 44% vai para a reserva de emergencia da empresa
• 12% para a divisão societária

Por curiosidade os valores

• R$ 6,60 vai pra empresa
• R$ 6,60 vai para a reserva de emergencia da empresa
• R$ 1,80 para a divisão societária

Esse é o mínimo para não quebrar aí entram os outros pontos que o pessoal comentou, além disso:

• Falta de perícia técnica, geralmente esse erro consiste em fornecer uma solução ineficiente para um problema, por exemplo: a gente vê muito com alguns produtos usando IA hoje em dia, muitas vezes um simples "ORDER BY" em uma tabela resumo no banco de dados resolveria porém além da pessoa gastar para incorporar o tal "Relatório inteligente" necessitando subir e muito o preço, o concorrente vai lá faz a tabela resumo e entrega sem subir o preço

• Falta de pesquisa do mercado, esse erro é bem comum, consiste em fornecer uma solução para um problema que não existe

• Falta de administração empresarial, é o típico caso onde mesmo tendo pesquisa de mercado, Falta de perícia técnica e tendo uma gestão eficiente de recursos, a empresa não tem um plano de negócios, não consegue se definir, tem uma taxa muito grande de pivotagem (não ter pivotagem é ruim, ter muita pivotagem é muito ruim), querer ter funcionário antes da hora e aí começar a acumular cargos sem remunerar adequadamente

• Falta de administração pessoal, esse parece não ter relação mas na minha opinião é o pior deles uma vez que é o que pode levar a qualquer um dos outros erros citados, a origem mais comum desse erro é querer subir o padrão de vida muito antes do tempo, por exemplo: Financiar carro, casa e afins porque teve um ano contábil favorável, chegar atrasado, faltar a empresa, sair mais cedo porque "é o patrão" dentre outros

• Produto desinteressante (falta de pesquisa do mercado)
• Falta de investimento
• Falta de Administração

Uma empresa precisa fazer 3 coisas:

• Vender mais
• Gastar menos
• Garantir o melhor produto

As empresas que falham na sua maioria terão errado em algum desses itens.

Não foi no meio digital, mas na minha família o que quebrou as empresas que montamos foi a violência, não dá para trabalhar sendo assaltado toda semana ou mais vezes.

Um cuidado valido é de escolher empreender para realmente ter uma empresa e não ser um autônomo.

Na maioria das vezes, deixar de ser clt para ser autônomo não é um bom negócio, pois você trás para sí as responsabilidades daquela atividade, os riscos envolvidos e não tem um fluxo de caixa previsível.

A principal característica e benefício de uma empresa é que ela pode operar sem depender de você...
Aquele "ganhar dinheiro enquanto dorme, viaja etc." existe, mas tem que pagar o preço para chegar até ele.
Tem que lidar com pessoas, contratos, contabilidade, se arriscar etc.
Diariamente precisa sair da zona de conforto.

Quem é programador, por exemplo, compensaria ter um CNPJ, mas sempre depender do proximo projeto para não ficar sem grana?

Depois que comecei a empreender com meu saas tive que lidar com atendimento ao cliente, suporte, posicionamento da empresa diante do público, entendimento do funcionamento daquele seguimento de empresa que estava atendendo, prospecção de clientes, contabilidade etc.
Sobre entender o nicho, hoje até possuo um negócio, junto com minha esposa, no mesmo seguimento que atendo com meu saas, para ver em que nivel podemos chegar kkk.

Tem que gostar para conseguir entrar de cabeça...

Segundo estudo realizado pelo Sebrae a partir das bases de dados da RFB e de pesquisas de campo realizadas entre 2018 e 2021, entre as empresas fechadas em 2020 verificou-se:

• Maior proporção de pessoas que estavam desempregadas antes de abrir o negócio;
• Menor conhecimento/experiência anterior no ramo;
• Maior proporção de quem abriu por exigência de cliente/fornecedor;
• Maior proporção de quem abriu por necessidade;
• Maior proporção de quem conhecia menos aspectos relevantes do negócio;
• Tiveram menos acesso ao crédito (pediram menos e conseguiram menos);
• Tinham menos iniciativa em aperfeiçoar o negócio;
• Fizeram menos esforços de capacitação;
• Perto de metade das empresas que fecharam em 2020 considera que “a pandemia foi determinante”.

Fatores que contribuíram para o fechamento dos negócios:

1. Pouco preparo pessoal

Em média, 42% estavam desempregados, mas essa proporção chegou a 59% no grupo das empresas fechadas;
Mais de 40% dos entrevistados eram funcionários de empresa privada antes de abrir seu próprio negócio. Outros 37% eram autônomos sem empresa constituída;
Em média, 42% fizeram alguma capacitação. Mas no grupo das empresas fechadas foi maior a proporção de quem não fez nenhuma capacitação;
Entre as empresas em atividade, foi maior a proporção de quem abriu porque “identificou uma oportunidade”.

2. Planejamento do negócio deficiente

17% dizem não ter feito nenhum planejamento e 59% dizem ter feito para no máximo 6 meses;
Muitos deixaram de levantar informações relevantes para criar o negócio.

3. Gestão do negócio deficiente

Na “gestão do negócio” as empresas que sobreviveram se mostraram mais ativas;
Diferenciação/adaptação de produtos/serviços foi estratégia relevante para a sobrevivência.

4. Problemas no ambiente (pandemia)

Mais de 40% citaram explicitamente como um dos principais motivos para o fechamento da empresa a pandemia da Covid-19;
Entre as empresas fechadas, foi menor a proporção dos que tentaram empréstimo e foi menor a proporção dos que conseguiram.

Fonte: https://sebrae.com.br/sites/PortalSebrae/artigos/a-taxa-de-sobrevivencia-das-empresas-no-brasil,d5147a3a415f5810VgnVCM1000001b00320aRCRD