[REFLEXÃO] Como a busca pelo dinheiro está tirando minha vida
Cansaço, dores na cabeça, nos músculos, articulações, ansiedade, e insonia. Esses são alguns dos sintomas que eu tenho sentido nos últimos meses da minha vida. E a ideia é que esse texto não seja sobre finanças ou saúde, mas apenas um desabafo. Quero que seja leve, mas que seja entendido minha situação atual e como isso tem de fato me deixado cada vez pior, e ainda há uma certa fagulha de esperança que consigo sair daqui.
1 - O começo de tudo
Tudo começa em novembro de 2023, eu estava empolgado, família bem, eu estava recém chegado ao meu emprego atual, tinha meu trabalho secundário como DevOps também, tudo parecia que estava bem. Estava conseguindo manter a saúde mental, estava conseguindo estar com minha família, e principalmente, para contexto, estava conseguindo ter uma saúde financeira.
Quase nunca vemos o que está bem à nossa frente, né? Mas como tudo estava bem, exceto o tamanho da casa que morávamos, decidimos procurar uma casa. Bom vamos às contas, vivíamos em uma casa de 2 quartos e pagávamos exatamente 800€ para sobreviver na casa. Mas como tínhamos um bebê de 3 meses, e eu trabalho de casa, apenas 2 quartos não nos iria servir, pelo menos não por muito mais tempo.
Minha esposa querida fez o trabalho que eu odeio, procurar casas - E parece que isso virou mesmo um hobbie para ela, até hoje continua a fazer isso - e fez isso com maestria. Encontramos então uma casa de 5 quartos por um valor de início muito razoável, 1000€ ao mês. A grande diferença vem agora, onde estávamos o valor cobria todos os gastos da casa (Aluguel + Água + Luz + Internet + Gás), enquanto na nova teríamos pelo menos 4 novos gastos.
Ok, não parecia ser um grande problema, eu estava estável, emprego novo e fazendo entregas boas, trabalho secundário também bem tranquilo, quase nenhum problema. Casa nova, espaço, poderíamos até pegar mais um pet.. Ou quem sabe, dois?
2 - A lua de mel
Estavamos amando a mudança, tudo estava indo lindamente, muitas memórias boas foram criadas na casa. Lareira, muitos quartos, sala grande, banheira, tudo muito lindo. Exceto por alguns fatores, como eu disse adicionamos 4 novos gastos sendo eles: Água, Luz, Internet e Gás. Porém não tinhamos noção de quanto gastaríamos, e para melhorar entramos na casa num período de início de inverno.
Se você não sabe, aqui em Portugal o período de Outubro à Março é um período de inverno, ou seja, as temperaturas baixam bem. Não bastando isso a localização do imóvel é uma região que eu e minha esposa, carinhosamente, apelidamos de “Limbo”, porque é uma região na parte Oeste de Portugal, próximo ao litoral, que simplesmente possui um microclima específico, completamente diferente de uma região mais interiorizada mas na mesma latitude.
E dado que a casa era uma casa grande, de 2 andares, 5 quartos e que não tinhamos quase nenhum móvel, a casa ficava o tempo todo gelada, nos obrigando a ter que gerar energia de alguma maneira. Isso fez com que simplesmente nos dois primeiros meses (Dezembro e Janeiro) tivessemos uma conta de energia elétrica de simplesmente 100€/mês. (Acredite isso é mesmo muito).
Além disso tivemos um susto quando percebemos o quanto utilizamos de gás. Aqui a água é majoritariamente aquecida por gás, alguns utilizam serviços de distribuição de gás, mas como morávamos em uma região mais afastada, tinhamos que comprar as butijas, que na época estavam também à cerca de 100€, e esse inverno foi complicado, pois gastamos quase uma por mês.
3 - Gastos, gastos e mais gastos
Tudo muito bonito e muito legal, principalmente quando o inverno começou a acabar, diminuímos nossos gastos, e por mais que de modo geral tivessemos aumentado para quase o dobro o que eu gastava com a sobrevivência, as coisas ainda não estavam ruins, porque a nível de emprego estava estável. Trabalhando bastante, para fazer entregas no meu emprego principal e no cliente extra. A principal diferença era que a conta de poupança começava a diminuir.
Ainda mais quando tivemos visitas, pais, amigos, primos, avós, enfim, como nossa casa era grande, todos os que vinham para Portugal, tinham “lugar garantido” em nossa casa. De fato não teríamos encomodos exceto quando essas visitas resultavam em novos gastos, ou seja, tínhamos que estar junto com eles.
E confesso para vocês que foi incrível ter a presença de cada um deles, ainda mais depois de cerca de 1 ano longe de casa, foi maravilhoso. Poder ver a relação deles com meu filho, foi incrível e me enche de alegrias até hoje. Porém falar que as coisas estavam fáceis, é não estavam não. Tanto que essa sequências de visitas, foram um motivador para um novo gasto: Financiamento de Automóvel.
Na época tínhamos um carrinho antigo, vermelhinho, do ano de 2003, muito econômico, mas extremamente desconfortável e pequeno, além disso, pouco confiável. Quando fizemos a compra, fomos passados a perna por um outro brasileiro (eu entendo porque “odeiam” os brasileiros aqui), e compramos um carro com alguns problemas, tanto que tivemos que refazer parte do motor. O mais triste foi que no dia que iríamos trocar de carro, tinhamos a visita de um dos nossos pais, o vermelhinho, velho de guerra nos levou até o aeroporto, porém o problema surgiu no momento do almoço: motor ferveu, e tive que parar o carro, chamar o reboque e ir embora em cima de um caminhão. (Tinha sido sua última viagem)
4 - A primeira tentativa
Cansado de estar nesse ciclo de não ter mais dinheiro suficiente, tudo ser caro e me ver necessitado a pedir dinheiro para meus pais, eu cansei e comecei minha corrida para a busca pelo dinheiro. Eu sei que não é assim que se faz, mas eu precisava, não tinha mais como. Eu estava cansado do meu trabalho secundário, não sou um profissional que gosta de entregar pouco, e sentia que isso estava acontecendo. As demandas começaram a aumentar no trabalho principal e eu comecei a não conseguir entregar como eu gostaria no trabalho secundário.
Um basta tinha que acontecer. No final do ano surgiu uma tremenda oportunidade, “e se eu transformasse aquilo que eu de fato sei fazer, em algo que possa ser monetizado”, foi então que eu encontrei um colega antigo que tem um negócio para ajudar outros a montarem e crescerem seu negócio.
Porém tinha um pequeno problema, eu não tinha um negócio, eu apenas sabia fazer o meu trabalho, sou DevOps Engineer, como vou criar um produto a partir disso? Enfim, não sabia muito bem, mas tive o apoio da minha esposa e juntos acreditamos.
Já ouviram o termo “Salto de Fé”, foi exatamente o que fizemos, tudo o que eu tinha era meu conhecimento, esse meu colega, o programa dele e fé. Comecei a amadurecer a ideia, mas não foi tão bom quanto eu pensei. Começar um negócio é muito mais que desenvolver um produto, envolve tudo, tudo mesmo, porém eu já tinha dado meu salto de fé. Uma das coisas que fiz para poder me dedicar foi sair do emprego secundário, e ter fé que aquilo iria virar. Mas não foi, não do jeito que eu pensei, não rápido, não fácil.
A primeira tentativa começava meio falha, meio sem muita forma, e terminava logo em seguida. Eu cansado pois temos apenas nós, eu e minha esposa aqui, temos uma criança que precisa de atenção e uma casa que precisava de manutenção, um negócio que estava crescendo meio disforme e muita demanda vinda no meu trabalho principal. E claro uma frase que não saia da minha mente: “Quando você faz as coisas precisando do resultado, o resultado nunca vem”. Cenário legal, não?
5 - O recuo
O negócio não estava virando, acabei criando contas que eu não conseguia pagar no cartão de crédito, o dinheiro não bastava, tudo estava cada vez mais caótico. Eu começava a ficar sem tempo e tudo parecia começar a ruir. Eu tinha apenas 1 decisão à minha frente: Acreditar no incerto, ou Tentar algo um pouco mais “certo”?
Eu já estava ficando desesperado, não sabia mesmo o que fazer, eu vivia o dia todo pensando em como eu iria conseguir ganhar dinheiro, para simplesmente VIVER. Para colocar comida no prato da minha família, e simplesmente começar o dia seguinte. Nenhuma venda, apenas a tentativa de mostrar algo que estava realmente difícil. Por fim tomei a decisão, aceitar que tudo era mesmo difícil e manter o caminho um pouco mais “certo”.
Esse período foi complicado, assim como o herói que quer voltar para a sua zona de conforto, isso passou pela minha cabeça, desistir de tudo e voltar para meu país, minha família, ter uma rede de apoio, resumindo, desistir de tudo. E não foi de tudo, mas de algumas coisas, que desistimos, tomamos a decisão de dar um passo atrás, eu consegui um segundo emprego como professor - isso poderia me ajudar no futuro com meu negócio - para voltar um pouco e acalmar meus ânimos, além disso, nos mudamos para ter menos contas à pagar.
Enfim, esse recuo deveria acalmar meus ânimos, e realmente ser aliviante, porém não é assim que está sendo, desde que entramos nessa espiral descendente, parece que tudo tem caminhado como diz, para baixo. Parece que minha relação com minha esposa e meu filho está cada vez pior, sinto que não consigo ser o pai que eu gostaria e que simplesmente não consigo sair do lugar. Parece que as dívidas que eu acumulei estão me engolindo e o buraco está ficando cada vez mais fundo.
Curiosamente o caminho um pouco mais “certo”, não têm me ajudado, pelo contrário, de certa forma tenho ficado cada vez mais tenso e ansioso. A insônia que eu nunca tive começou a aparecer e parece que tudo não parece nada mais do que apenas repetição de dias horríveis e cansativos que vão finalizar, e começar novamente na manhã seguinte.
Conclusão
Curiosamente eu me enfiei num buraco “sem fim” que não consigo sair, como se não houvesse mais felicidade em fazer as coisas que eu faço. A mais simples felicidade que é estar com minha família - esposa e filho - parece se esvair, não ter vontade, ser explosivo, e com pouquíssima paciência.
Não valeu a pena, não valerá a pena. Da mesma forma que tudo veio de uma única vez, tudo parece ir embora de uma única vez também. Assim como negócios, produtos e projetos têm que se reinventar eu também sinto essa necessidade, sinto como se fosse uma forma de fazer mais do que apenas o que eu faço.
Não sei se alguém vai se identificar com isso, se já passou por isso, ou se está passando, o ponto é que correr atrás de dinheiro não vale a pena. As pequenas - e melhores - coisas da vida estão passando e nunca mais poderei encontrar ou vivê-las. Estou sentindo um chamado, mas ainda não sei ao certo como responder. Quem sabe esse texto não seja exatamente o primeiro som curto do código morse que eu envio como resposta.