Bem, vamos lá, vou tentar falar isso da melhor forma que posso, e talvez não goste, talvez outras pessoas não gostem, mas eu só sei fazer assim.
Você fala de duas áreas muito distantes entre si. Mas uma delas está sendo prejudicada bastante pela outra, como acontece em tudo. Sei que não tem o que fazer, o mundo sempre foi de alguma forma, e sempre será uma batalha de narrativas, bem ou mal, é o que é, só está mais sofisticado agora.
Programação é engenharia. Ela é o oposto do marketing. Mas muita gente sabe que o marketing faz qualquer coisa produzir mais riqueza. Em alguns casos entrega algo de valor e em outros não entrega muito. E ele sabe pegar os casos que entrega, ou os casos que a pessoa se vira para parecer que foi mérito do emissor e não do receptor. O que as pessoas podem fazer é se vacinar com isso e tentar identificar o joio do trigo.
Na minha visão tudo está piorando muito. Até os cursos superiores hoje estão mais preocupados com sua imagem de entregar diplomas do que entregar profissionais qualificados. Tem exceções, e em geral fazem isso mais filtrando quem entra o curso. Ou seja, cada vez mais o mérito é do receptor do que o emissor, ainda que vire uma simbiose.
Se algo tão sério quanto instituições de ensino autorizadas pelo MEC e que emitem algo muito sério quanto um diploma estão assim, e entraram no ramo de agradar ao aluno que está cada dia mais influenciado por dancinhas de Tiktok e coisas afins, que muda muito a cabeça delas, imagine cursos menos sérios.
É muito comum que os cursos existam por uma oportunidade de mercado. Se as pessoas querem, precisa ser entregue. Não é diferente de nada em outras áreas, de religião, ao comércio de drogas ilícitas, passando por qualquer outro produto. Só tem fornecedor porque tem comprador.
E olha que chega ser tão convincente que até o mercado começa aceitar isso como algo bom. Mais ainda quando tem vagas demais e mão de obra de menos. Mas tem parte do mercado que sabe do problema geral e exige um pouco mais. Então tem de um lado empresas precisando de gente qualificada em engenharia e do outro, pessoas que estão sendo formadas pelo marketing.
Em alguns lugares, para combater isso, estão fazendo exigências que demonstrem que a pessoa não cedeu demais ao marketing. Nem sempre é o certo, justo, mas ao mesmo tempo que tem muita demanda, tem muita oferta, e ruim. Qualquer abertura de vaga aparece muita gente interessada. Mas a maioria não é formada de verdade.
Quando eu falo em ser programador de verdade, tem gente que fica bravo. Mas eu não criei essa situação, estou apenas relatando. Podem ouvir ou ignorar. Se ignorar, a situação das pessoas permanecerá a mesma. Jogar pelada com os amigos não te torna apto a jogar no Barcelona. Quem diz o contrário está sendo marketeiro e te iludindo.
Quem faz muito isso são os cursos livres por aí. Não estou dizendo que todos são assim, mas em geral eles só existem para eles ganharem dinheiro. E esperam que algumas pessoas de talento natural e conseguem alguma coisa, para poderem mostrar que são bons, porque eles não entregam nada demais por conta própria.
Se o curso usa buzzwords é quase certo que ele optou pelo marketing. Curso que vende bem não pode ficar criando problemas para as pessoas, não podem chegar no fim e não emitir um certificado, mesmo que a pessoa não esteja apta para o mercado.
Vou contar uma anedota. No Twitter um cara muito conhecido no mercado respondeu alguém que reclamava que tal coisa não dava certo, que tinham adotado certa metodologia na empresa deles e deu tudo errado. O "treinador" famoso disse que eles foram mal formados e não tiveram boa assessoria. Pois bem, o reclamante revelou que o tal foi o treinador e consultor deles. Aí imediatamente, segundo o influencer, a culpa passou ser dos consumidores. Estes que receberam certificado dele. Se eles não estavam preparados porque receberam o certificado?
Ou seja, o certificado não tem valor mais. Diploma geralmente também não, mas já é um pouco mais sério. E não pense que estou falando isso à distância. Conheço isso mais perto do que você acha.
O mercado sabe que esses cursinhos que tem por aí não formam muito as pessoas. Que em boa parte dos casos pode ter pessoas que se deram bem porque se dedicaram. Essas vão saber se virar, vão entender o processo, e da mesma forma que elas se viraram com um curso ruim que vende alegria e não formação, que é algo duro, difícil, que dá dor, elas vão se virar para participar do processo seletivo.
Eu nunca fui contratado porque eu tinha os requisitos, fui contratado porque eu participei do processo e mostrei que eu era capaz. No meu primeiro emprego a vaga foi criada pra mim, ela não existia. Meu primeiro grande emprego eu fui contratado concorrendo com gente formada em USP, Mackenzie e FGV, que eram os requisitos, porque eu mandei o currículo e eu sabia fazer o que os que tinham os requisitos não sabiam.
Não sou nenhum gênio, sou bem mediano, mas eu tinha facilidade para a área e sabia ir atrás do que importava. Naquela época o marketing não dominava, mas já tinha muita gente entrando por moda.
Até cursos conhecidos colocam no mercado pessoas sem muitas condições de trabalho. O diploma é uma forma de dar uma selecionada, caso contrário recebem currículos demais. Recebem currículos de quem fez um curso de buzzword que não formou a pessoa, e que ela acha que porque tem um certificado está pronta para o mercado. Eles estão só tirando um pouco das pessoas muito ingênuas que compraram o marketing.
Desculpe por quebrar a ilusão, mas tem hora que é melhor saber que Papai Noel não existe. Assim pode começar a fazer o que é necessário para ter uma carreira séria. Não importa se é com curso superior ou não, só não pode achar que aprende buzzwords e está apto para o mercado. Se a pessoa pode aprender sozinha, com cursos livres ou curso superior, não importa, mas ela tem que saber desenvolver soluções para outras pessoas. E isso não é fácil, precisa de muita dor.
Alguns influencers por aí são pessoas com pouca experiência real, e você vê isso se ela tem coisas públicas, mas mostram que não sabe nada, não conseguem ver as falhas cometidas, mas são pessoas com uma capacidade incrível de comunicação. Elas não vão ensinar as pessoas a serem boas profissionais, vão entregar felicidade. É a essência do marketing. Isso vale pra tudo, não importa se vendem cursos de finanças e comércio, maquiagem ou programação, não é nada específico.
Algumas pessoas podem até começar assim e mudar sua carreira em certo momento, e até terão um caminho de sucesso. Um dia até agradecerão o famoso que ajudou ela entrar, mas não darão mais tanto valor para o que foi entregue. Mas a maioria ficarão pelo caminho, ou terão espaço no mercado fazendo o "mais ou menos", como foi ensinado para ela. E pode ser suficiente dada a enorme carência de mão de obra. Hoje boa parte das vagas são preenchidas por quem só teve formação mais ou menos.
Não estou dizendo que a faculdade te garante boa formação, que você está preparado, mas mostra, em certos cursos, que a pessoa passou por um crivo. É mais fácil para o RH.
Quem sabe faz a hora, não espera acontecer.
Eu não tenho muita solução. Se eu tivesse talvez eu ficaria rico vendendo isso. Eu sei que só dará certo para quem está bem preparado com o fundamento (matemática, comunicação e expressão, ciências), que seja capaz de questionar, de achar soluções só com isso, que enxerga o mundo e vai tentando soluções. Eu sei que posso ajudar algumas pessoas, mas a grana séria virá das pessoas que eu não entregarei solução, porque ela não se ajuda e eu não consigo fazer milagre. Então prefiro não fazer, eu tenho muitos defeitos mas falta de caráter não é um deles, não vou enganar ninguém.
Eu estou gastando um tempo enorme da minha vida aqui, agora, porque percebo que esse drama acontece cada vez mais. E eu gostaria de poder ajudar mais. E só sei dizer que a pessoa precisa começar a se responsabilizar mais por sua vida. Enquanto entregar para terceiros, que não tem nenhum compromisso com o sucesso de ninguém a não ser o próprio, não tem solução.
Me desculpe, mas se a pessoa não consegue achar solução para a própria carreira, como ela vai achar soluções para empresas que precisam de marketing ou TI?
Não tem solução mágica, não tem uma resposta simples que resolva a vida da pessoa. Tem que se dedicar, muito, o tempo todo, aprender muito além do que parece, precisa entender o mercado, ver o que precisa fazer de forma ampla. Não tem receita de bolo para programar coisas novas, e para carreira.
Eu consegui emprego mostrando que eu sabia como resolver problemas. De programação ou não. Aprendi em tempo que não tinha internet, outras pessoas referência, ou até acesso a bons livros facilmente. Em certo momento nem computador, e quando tive acesso era algo que não fazia quase nada. Hoje já está tudo disponível. É só pesquisar. A dificuldade atual é separar o joio do trigo, porque quase tudo é joio. É um desafio diferente. Mas fazer isso vai criando casca. E a pessoa começa a fazer isso quando a ilusão é quebrada.
Eu não posso dizer para desistir de um sonho para ir para outro. Não sei se isso trará benefício para você. Não sei como é ter dois sonhos. Eu tive um e fui nele. Agora apareceu outro, estou começando a me preparar para ele e é algo que envolve o físico, algo que um "velho" como eu não costuma fazer, e eu não estou nem aí, vou cavar meu espaço, não me importa se vai dar certo.
Então, respondendo sua pergunta, sim, você está velho para TI. Um jovem jamais faria esse questionamento. Por sorte dá para rejuvenescer fácil. Você "está saturado" para o mercado, mas pode mudar a atitude e deixar de estar. Se vai fazer ou não, é com você.
Não adianta muito eu falar aqui para começar aprender programar de verdade, se apegar ao que importa, ao que dá soluções para os problemas, para fazer projetos e mostrar para as pessoas que é capaz, para estudar sério, para fazer curso sério se precisar deles ou para continuar ou parar o que está fazendo. Se fizer certo funcionará, se fizer errado não funcionará. Abandonar ou continuar o curso dará consequências, para você, não pra mim, qualquer coisa que eu falar não serei responsável.
Existem profissionais especializados, alguns bons, outros não, para dar atendimento personalizado para quem está muito perdido. Mas cai no problema de sempre, não é fácil achar quem é bom, é uma informação assimétrica. O que eu sei é que na internet, só vai achar opinião irresponsável, por definição, até a minha.
Eu só posso te incentivar a achar seu rumo. Nas vezes que eu estava perdido gastei muito tempo, fiquei como barata tonta e nada me ajudou, o rumo é fundamental. Toda vez que esperei algo de outras pessoas, até próximas de mim, não deu certo.
O mercado precisa de gente boa, preparada. O mercado é moedor de carne. Tem espaço para ilusionistas, mas tem mais chance quem tem algo concreto para entregar.
Você poderia juntar as duas coisas. Pode ser uma combinação ótima, para bem ou mal da sociedade, mas boa para você.
A esmagadora maiora das pessoas que trabalham na área não tem curso superior, pra bem ou pra mal. A conta não fecha. A visão que as pessoas têm do mercado está completamente equivocada.
Ah, se não ficou claro, "curso de full stack" é uma das maiores enganações que já apareceram no mercado. A não que custe mais que uma casa e dure muitos anos. Se o curso for bom ele entrega o que o mercado quer: capacidade de desenvolver soluções em software. Diploma não garante isso.
Lamento quem não gostou. Nem tudo dito aqui é válido para todo mundo. A vida é mais complicada que isso.
Quase tudo o que alguém gostaria de saber eu já respondi em diversas plataformas. Eu farei de novo, e vou centralizar em uma plataforma mais atual, e mais curada por mim, sem responder às demandas específicas e fugazes, mas eu decidindo o que publicar. Tem formatos ruins. Aqui por exemplo, semana que vem, ou amanhã, isso estará enterrado e ninguém mais lerá.
Farei algo que muitos pedem para aprender a programar corretamente, gratuitamente. Para saber quando, me segue nas suas plataformas preferidas. Quase não as uso, não terá infindas notificações (links aqui).