Precisamos falar sobre dinheiro
Dia desses, scrollando o feed do Instagram, me deparei com a seguinte frase: "O dinheiro não é a coisa mais importante, mas a falta dele afeta diretamente todas as coisas mais importantes".
No Brasil, falar de dinheiro é tabu. A real é que todo mundo gosta de dinheiro, mas a grande maioria tem vergonha de assumir.
No texto de hoje eu vou te contar um pouco mais sobre a minha longa relação com esse assunto. Vou te contar também, como é a minha relação com o dinheiro hoje em dia e qual a melhor forma de investir.
Vamos lá?
A minha relação conturbada com o dinheiro
Eu nasci em uma família de classe média baixa, no subúrbio da zona norte de São Paulo. Graças a Deus nunca passamos fome, mas dinheiro (ou a falta dele) é uma questão que permeia praticamente toda a memória que tenho da minha infância.
Meus pais sempre trabalharam muito duro. Mesmo assim, sempre tiveram problemas financeiros.
Me lembro como se fosse hoje. A febre do DVD tinha tomado forma. Todos os meus amigos comentavam dos filmes, séries e shows piratas que seus pais compravam nos camelôs e assistiam em seus aparelhos. Eu, ainda preso no VHS, não participava da conversa.
Diante disso, fui pedir para a minha mãe comprar um aparelho de DVD. Ela também queria assistir e comentar filmes. Mas um aparelho de DVD era caro. Comprar à vista, nem pensar. A prazo também não dava, pois o nome dela estava sujo e o cartão de crédito cancelado.
A solução foi pedir emprestado o cartão de crédito da minha tia. O valor à vista não cabia no bolso, mas a parcela da compra, feita em 10x e com "pequenos" juros, cabia.
Pode até ser meio maluco falar em dificuldades financeiras para conseguir comprar um ítem supostamente supérfluo quando vivemos em um país em que metade da população não tem sequer acesso a rede de esgoto.
Acontece que, essa batalha de vender o almoço para comprar a janta, afeta o nosso psicológico negativamente, mesmo que em proporções menores, se comparado a quem vive na miséria. Esse perrengue afetava o psicológico dos meus pais e também afetou o meu. Não à toa estou aqui hoje escrevendo esse texto.
Grande parte do nosso perrengue financeiro acontecia por causa de um alto custo mensal do qual meus pais nunca abriram mão: o colégio particular de ótima qualidade em que sempre estudei.
Estudei em um colégio de freira, com mais de 80 anos de tradição e que era famoso por ter o melhor ensino da região. Para se ter uma ideia da qualidade do ensino, no ano em que eu fiz o ENEM e prestei vestibular para faculdade, o desempenho agregado do colégio foi espetacular: ficamos entre os 70 melhores do estado, num ranking de mais de 1.000 escolas.
Essa boa educação de base é praticamente o alicerce principal que sustentou toda a minha vida adulta. Para se ter uma ideia do quão bom era o ensino, na época do vestibular eu não fiz nenhum tipo de cursinho e nem estudei por fora. Somente com o conteúdo e o volume de estudos padrão do ensino médio eu consegui conquistar vaga em duas universidades públicas, sendo que, em uma delas, eu fiquei entre os 10 melhores colocados.
Uma das consequências de ter estudado em um colégio particular foi essa boa educação. Outra consequência foi o fato de eu ter sido sempre o menino "pobre" convivendo no meio dos ricos. O lado bom disso? Desde cedo eu fui exposto a uma realidade completamente diferente da minha.
Uma das lembranças que mais marcaram minha mente foi uma viagem que fiz com amigos da escola quando eu era adolescente. Nessa viagem aconteceram duas coisas em específico que me fizeram explodir a cabeça.
A primeira delas foi que, ao chegarmos no apartamento, localizado em uma das melhores praias do litoral de São Paulo, descobrimos que a TV do quarto não estava funcionando. Como quem sai para comprar pão na padaria, o pai do meu amigo disse "caramba… vamos ter que ir ao mercado comprar uma TV nova".
Como assim?!?!! Lá em casa a gente precisa pedir cartão emprestado para parcelar um aparelho de DVD em 10x enquanto essa pessoa simplesmente entra no mercado, escolhe uma TV e paga à vista. Eu nunca tinha vislumbrado nem a mera possibilidade de que isso fosse possível.
Depois desse acontecido, no dia seguinte, fomos para a praia aproveitar aquele calor de rachar. O destino foi um quiosque de praia, bem famoso, inclusive. Além da família desse meu amigo, outras duas famílias amigas estavam conosco. Que dia agradável! Comida boa, bebida boa, praia, sol, gente bonita… Nunca tinha passado um dia tão confortável quanto aquele.
Até que chega a conta. Se trouxermos para valores atuais, eu chuto que a conta tenha dado mais de R$ 3.000 reais. Até aí, ok. Dado o nível financeiro do pessoal, o local em que estávamos e o tempo que ficamos, era esperado uma conta desse tamanho. O que me assustou de fato não foi a conta, mas sim a postura de todos perante a conta. Quando me deparei, os pais de cada família estavam "brigando" entre eles, reivindicando a conta para si. Fiquei abismado. Eles querem pagar essa conta sozinhos? Sem dividir?? Como assim!?!??! Eu não estava acreditando.
Ter sido exposto a situações como essas, desde cedo, me fez enxergar um mundo completamente diferente. Um mundo onde não havia escassez, só abundância. Um mundo onde a relação com o dinheiro fosse algo bom, e não algo ruim, como sempre foi comigo e com meus pais.
Mais importante ainda era saber que, por exemplo, o pai desse meu amigo era uma pessoa de origem humilde, parecida com a minha, que batalhou e venceu na vida, financeiramente falando. Conhecer uma história assim me fazia enxergar que, se ele tinha conseguido, eu também poderia conseguir.
Por ter convivido durante toda minha infância e adolescência com pessoas que tinham situações financeiras confortáveis, eu entrei na vida adulta com um objetivo muito claro na vida: eu quero viver a vida boa dos meus amigos!
A busca pela segurança financeira
Por mais que eu tenha experienciado alguns poucos momentos de abundância e prosperidade durante a minha infância e adolescência, o meu dia a dia sempre foi de escassez.
"Mãe, por que você não troca esse fusca velho?" eu perguntava. "Porque eu não tenho dinheiro" ela respondia. "Mãe, por que a gente não vai viajar nas férias?", "Pai, por que a gente não vai comer naquele restaurante gostoso?", "Mãe, me dá um computador novo?", "Pai, me dá um videogame novo?". Para todas essas perguntas, a resposta era sempre "Não tenho dinheiro".
Por causa dessa instabilidade financeira, eu cresci ouvindo dos meus pais e familiares que o meu papel, como adulto, era aproveitar a oportunidade de ter tido uma ótima educação de base e me dedicar ao máximo possível para conseguir passar em uma faculdade pública e "garantir o meu futuro".
Foi o que eu fiz. Logo que eu completei 18 anos, eu comecei a cursar Análise e Desenvolvimento de Sistemas no IFSP, o Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia de São Paulo.
No segundo semestre, se não me engano, eu consegui um estágio no Centro Latino-Americano e do Caribe de Informação em Ciências da Saúde, também conhecido como BIREME. A BIREME é um escritório regional ligado à OPAS, Organização Pan-Americana da Saúde, que é o escritório regional da Organização Mundial da Saúde, a OMS.
Entrar no detalhe de siglas, nomes e locais é chato, mas necessário, pois são esses detalhes que ilustram uma característica muito interessante do começo da minha carreira. Todos esses locais são, praticamente, instituições públicas. Elas não atuam no setor privado. São organizações sem fins lucrativos. Na prática, eu comecei a minha vida profissional trabalhando em locais muito parecidos com repartições públicas.
Uma infância e adolescência permeadas de escassez, junto a 3 anos de trabalho nesse ambiente moldaram a minha mentalidade na época. E a minha ambição, que antes era a de buscar viver uma vida boa, agora era me manter num emprego estável, levar uma vida frugal e guardar dinheiro. A tal da estabilidade financeira. E foi assim que eu vivi durante os meus primeiros anos profissionais.
Financeiramente falando, essa estratégia até que deu algum resultado, pois eu consegui guardar um dinheirinho. Acontece que esse comportamento acabou com a minha mentalidade. Eu vivia numa mentalidade completa de escassez.
Antes de continuarmos, um breve disclaimer: A essa altura do texto, eu imagino que você deva estar sentindo um certo desconforto. "Que papo mais esquisito. Abundância, escassez.. isso é papo de coach". Sim, isso é papo de coach, mas não significa que seja bullshit e, principalmente, que não deva ser discutido. Continue acompanhando o texto que você vai entender meu ponto.
Quando eu me dei conta, eu tinha me tornado uma pessoa desagradável. Eu era completamente mesquinho. Fazia conta para tudo. Buscava vantagem em qualquer situação. Me lembro que, no final da balada e morto de fome, eu deixava de tomar refrigerante para poder comer mais um lanche e economizar dois reais. Passava sede e tentava enganar a cabeça enchendo o lanche de ketchup. Olha que comportamento absurdo.
E o pior: se, em algum momento, eu decidisse abrir a mão e gastar um pouquinho mais com algum prazer, como com uma viagem, por exemplo, eu não conseguia curtir o momento pois me sentia culpado de estar gastando dinheiro.
Nessa época eu imaginava que a solução para esse problema era trabalhar para juntar dinheiro suficiente para viver de renda. A ideia era fazer isso o mais rápido possível. Só assim eu poderia começar a viver a vida de fato.
Esse pensamento até parece ter lógica, mas nunca iria acontecer, porque, na verdade, é um pensamento burro. Um comportamento transforma a pessoa numa pessoa mesquinha e, uma pessoa mesquinha, que sempre está fazendo conta e só topando situações onde existe uma clara vantagem a ser obtida, nunca conseguirá desfrutar do que, de fato, nos faz prosperar: os acasos da vida.
Para poder desfrutar dos acasos da vida, você precisa se colocar nos mais diversos tipos de situações, e não somente naquelas em que você leva vantagem. As melhores oportunidades da vida acontecem devido a situações onde você se doa. Elas acontecem em situações onde você pensa primeiro no outro, e depois em você. Uma pessoa mesquinha e avarenta é incapaz de ter essa postura.
Eu demorei 26 anos da minha vida para começar a entender isso.
No final de 2017 eu estava completamente infeliz no trabalho e na vida pessoal, quando decidi, até meio que de forma inconsciente, me expor a ambientes novos. "Vamos ver no que vai dar", pensei.
Foi quando eu comprei uma passagem, reservei um hotel barato e fui para a Python Brasil, que naquele ano estava acontecendo em Belo Horizonte. Lá eu conheci uma turma barulhenta, com uma galera meio marrenta, mas muito gente boa. Era o pessoal do Welcome to the Django, curso e comunidade do meu amigo Henrique Bastos.
Com essa turma eu comecei a aprender mais sobre desenvolvimento pessoal. Esse foi o início dessa mudança de mentalidade. Foi ali que eu comecei a destravar a minha mente e as coisas começaram a acontecer, financeiramente, para mim.
Para encurtar a história, eu entendi que, para ser feliz, eu precisaria arriscar mais, que era o completo oposto do que eu estava fazendo. Seis meses depois eu estava saindo da casa da minha mãe e indo morar sozinho. Isso pode parecer um movimento natural e até meio óbvio, mas era o completo oposto do que todos meus pares estavam fazendo.
"Moacir, você é um cara tão inteligente. Como assim você vai sair do conforto do lar e jogar dinheiro no lixo pagando aluguel?". Foi difícil "remar contra a maré", mas meu instinto dizia que era isso que eu devia fazer. Graças a Deus.
No começo passei bastante perrengue. Algum perrengue financeiro mas, principalmente, muito perrengue psicológico. Que bom. Foram esses perrengues os primeiros estímulos que moldaram minha maturidade emocional e psicológica.
Daí pra frente só aconteceram coisas boas na minha vida. Levei um empreendimento a sério pela primeira vez na vida, que foi a Codevance. Me envolvi em outro empreendimento, a DevPro, e tive relativo sucesso em ambos. Eu nunca ganhei tanto dinheiro como havia ganhado até então. Psicologicamente, eu, de fato, amadureci e me tornei um adulto.
O mais importante de toda essa jornada foi o resgate da minha ambição. Eu deixei de ser a pessoa que jogava para não perder e passei a ser a pessoa que joga para ganhar. Eu deixei de "fugir" do perrengue financeiro para começar a buscar aquela vida boa dos meus amigos, lá da adolescência.
O seu maior ativo é você
Todo mundo que tem algum interesse por dinheiro já leu um livro chamado Pai Rico, Pai Pobre, de um cara chamado Robert Kiyosaki. Se você nunca leu esse livro, aqui vai um brevíssimo resumo.
No livro, o autor apresenta diferentes filosofias de vida financeira. O Pai Pobre representa a mentalidade de uma pessoa que se concentra em trabalhar por um salário, economizar dinheiro, evitar riscos financeiros e geralmente seguir o caminho tradicional de educação e emprego. Essa mentalidade tende a criar uma vida financeira mais estável, mas não necessariamente rica.
O Pai Rico representa a mentalidade de uma pessoa que entende a importância de investir, adquirir ativos, empreender e adotar uma abordagem mais arriscada para construir riqueza. Essa abordagem envolve aprender sobre finanças, investimentos e como fazer o dinheiro trabalhar para você.
O livro explora as diferenças de mentalidade entre esses dois "pais" através de uma historinha bem legal e didática. A base da teoria é de que a educação financeira é crucial para alcançar a independência financeira.
Se fosse para resumir toda a teoria do livro, eu resumiria dessa forma: para enriquecer, você precisa construir ativos e gerar fluxos de renda passiva, em vez de depender apenas de um salário.
No começo da vida, eu imaginava que, para construir ativos, o que eu deveria fazer era economizar dinheiro para investir e viver da renda desses investimentos. De fato, esse pensamento não está errado. Ele só está incompleto.
O livro esquece de mencionar que, salvo raríssimas exceções, ninguém fica rico investindo. A sua real oportunidade de enriquecer está no trabalho.
O caminho para o enriquecimento é simples: Primeiro você desenvolve um ofício que te faça ganhar muito dinheiro. Então, você tira um pedacinho desse bolão de dinheiro que você ganha para poder viver (viver bem, já que um pedacinho de um bolão é muita coisa) e então reinveste o restante do dinheiro em ativos.
A fórmula é simples. Não é fácil, mas é simples. E por que a maioria não consegue? Porque a nossa mentalidade, como cidadão, é moldada para buscar garantias, exatamente como faz o Pai Pobre. "Estude bastante que você vai garantir um bom emprego". "Poupe parte do seu salário para garantir uma boa aposentadoria". "Viva uma vida frugal para garantir que você nunca passe aperto financeiro".
Meu amigo, sinto lhe informar, mas, na vida, não existem garantias.
O venezuelano, que passou todos os anos 80 e 90 trabalhando firme e poupando dinheiro, perdeu todo seu patrimônio porque ditadores comunistas derreteram o valor da moeda nos últimos anos.
A minha mãe, que trabalhou durante décadas da sua vida para apenas um empregador e cumpriu com todas as suas obrigações de forma exemplar, tanto como funcionária, quanto como cidadã, se aposentou com uma mão na frente e outra atrás, porque o patrão nunca depositou o seu fundo de garantia.
Um amigo de 30 e poucos anos, que tinha um emprego estável, trabalhava firme e estava construindo sua família e sua riqueza, pegou COVID durante a pandemia e morreu.
A grande maioria das pessoas da geração dos meus pais se aposentaram mas precisam seguir trabalhando, pois, mesmo tendo contribuído para a previdência pública durante toda as suas carreiras, não recebem o suficiente para manter o padrão de vida que sempre tiveram.
Repito: na vida, não existem garantias.
Portanto, o único caminho para se "garantir" é entender que você é o seu maior ativo. Se você é uma pessoa que não veio de família rica ou ainda não tem um patrimônio que gere renda o suficiente para você não precisar trabalhar, **o seu maior ativo não é o dinheiro que você tem, mas sim a sua capacidade de fazer mais dinheiro. **
E como se desenvolve essa capacidade? Investindo em você. Invista deliberadamente em você, em todos os aspectos possíveis.
Invista no seu desenvolvimento técnico. Invista na sua capacidade de liderar pessoas. Invista no seu desenvolvimento emocional. Invista no seu desenvolvimento intelectual. Invista na sua capacidade de se relacionar. Invista na sua rede de relacionamentos. Invista no seu desenvolvimento psicológico. Invista no seu desenvolvimento físico. Invista na sua saúde. Invista na sua capacidade de ser uma pessoa que gera valor.
Ser uma pessoa capaz de gerar valor é o mais próximo que você pode chegar de ter alguma garantia na vida.
…
A ideia desse post era contar um pouco também de como eu invisto em mim. Mas o texto ficou grande demais (eu gosto de contar história rs).
Se você quiser saber o que eu faço com o meu dinheiro em relação a investimento, responda esse email (ou deixe um comentário) para eu saber.
Abraços!
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