Meu guia de entrevista - Uma abordagem orgânica para se conectar com os candidatos
Gosto de falar que entrevistas são orgânicas, pois ela vai se adaptando conforme o candidato e entrevistador se comunicam. Por melhor que seja o roteiro ele jamais será seguido 100% a risca, dado que, a história de cada candidato é única que fazem suas experiências também serem. Também gosto de “desformalizar“ uma entrevista, pois no meu entendimento, você só conhece uma pessoa de verdade quando ela está confortável para expressar seu “verdadeiro eu”. Quanto mais formal uma reunião, mais seu candidato será protocolar, e na minha experiência, empresas são pessoas e elas não são protocolares como robôs.
Eu nunca começo uma entrevista falando da vaga em si, eu tento criar um ambiente descontraído, até para fazer o candidato esquecer brevemente que está sendo avaliado. No meu roteiro de entrevista existe uma fase prévia, que é uma pesquisa sobre o candidato. Além de ler seu currículo, eu gosto avaliar os posts no LinkedIn, quais ele curte e as empresas que segue. Tudo com a finalidade de entender mais quem é aquela pessoa e que profissional ele reflete. Isso me da uma base de como iniciar a entrevista, por exemplo, caso tenha visto posts curtidos de algum tema específico, tento puxar como papo inicial da entrevista. Existem casos onde puxo um assunto baseado no que vejo na câmera do candidato, por exemplo, estátuas de anime, ou foto de um cachorro. Tento gastar uns 5-10min nessa fase. Ahhhh, ponto importante: não gosto de entrevistas longas, é maçante para ambos. Minhas entrevistas duram cerca de 1h, acho tempo suficiente.
Após a etapa inicial de “ice-breaker“ vamos ao que interessa: extrair informações do profissional e entender se ele faz sentido para a empresa. Tento (entrevista são orgânicas, lembra?) seguir o seguinte roteiro:
- História profissional do candidato [5-10 min]
- Perguntas Técnicas [15 min]
- Avaliação ao vivo [25 min] *(Opcional e depende do seu processo)
- Discurso sobre a empresa [5 min]
- Abro para dúvidas do candidato [5 min]
A história do profissional é a parte mais importante, fique atento a tudo que ele fala, pois ela serve de filtro para suas perguntas técnicas. Por exemplo, se o profissional fala muito de um tema que trabalhou, pode ser interessante avaliar se ele sabe realmente esse tema (aprofundar) porém é importante avaliar o contra ponto. Como serão seus conhecimentos em outros temas correlatos, será que faz sentido também perguntar sobre? Vou dar um exemplo referente a um desenvolvedor que entrevistei: ele falava que tinha trabalhado com diversas aplicações e arquiteturas, quando fui para as perguntas técnicas eu filtrei dois temas que gostaria de entender mais sobre essa skill comentada e fiz as seguintes perguntas:
Consegue me explicar os benefícios da arquitetura limpa (Clean Architecture)?
Trabalhou com testabilidade? Quais já aplicou? Consegue enumerar alguns benefícios?
Entendeu o ponto né? Utilize essa etapa para compreender pontos positivos e possíveis dúvidas para direcionar suas perguntas técnicas posteriormente. Não faz sentido você puxar a entrevista para fora da zona de conforto do candidato, use seu histórico para direcionar a entrevista a um caminho menos tortuoso, ele está sendo avaliado e sendo pressionado, se você levar para assuntos que ele não tem afinidade, te garanto, será uma péssima experiência. Vou dar um exemplo, uma vez eu fui entrevistado por uma pessoa que focou nas entrelinhas da linguagem JAVA, P.S: eu trabalhei com JAVA ha uns 5 anos atrás e por pouco tempo (2 meses). O entrevistador perguntava de métodos syncronized, é óbvio que eu não lembrava da resposta. Só para contextualizar:
Os métodos sincronizados permitem uma estratégia simples para evitar interferência de thread e erros de consistência de memória: se um objeto estiver visível para mais de um thread, todas as leituras ou gravações nas variáveis desse objeto serão feitas por meio de métodos sincronizados.
Onde quero chegar… O que eu perguntaria: Você tem experiência em aplicações distribuídas? Consegue listar problemas que precisam ser avaliados e quais soluções possíveis? Tenho certeza que eu responderia sobre problema de acesso simultâneo a recursos, deadlock… Falaria de semáforos, locks… Enfim, entende? Tudo é a forma como você expressa sua pergunta.
Resumindo, filtre suas perguntas técnicas baseando-se na história profissional do candidato. E faça perguntas que façam sentido no contexto do candidato que está entrevistando. Segue um guia que eu tento seguir quando entrevisto desenvolvedores: veja aqui. Existem casos que os candidatos não atendem o esperado, e o clima de frustração fica perceptível. Para evitar chegar nesse nível, eu tento sempre fazer da entrevista uma forma de aprendizado. Se o candidato está com dificuldade de responder tecnicamente, ajude-o, explique sua pergunta, ensine a resposta certa. Por exemplo, uma vez perguntei a diferença de Container para máquinas virtuais. O candidato se enrolou, eu expliquei. Tenho certeza que dessa forma ele sairá da entrevista muito mais satisfeito, mesmo sabendo que pode não ter ido bem.
A avaliação ao vivo depende do seu processo seletivo, fiz um post sobre isso, veja aqui. Mas é uma fase complicada, é onde o candidato sofre maior pressão. Ele está sendo avaliado com os entrevistadores observando. Minha dica é tentar ajudar o candidato, caso note que ele está com dúvida facilite ele sair do outro lado. Não existe coisa pior que deixar o candidato travado sem conseguir fazer nada, é extremamente frustrante. Transforme esse momento em uma oportunidade de aprendizado.
A etapa “Discurso sobre a empresa“, pra mim, é a oportunidade do entrevistador VENDER a empresa. Tente mostrar o que a empresa tem de bom, experiências que já vivenciou nela e que foram positivas, é valido colocar pontos negativos pra mostrar que a empresa também não é perfeita. Por exemplo, uma vez fazendo entrevista, falei que a empresa me deu oportunidade de crescimento muito rapidamente, que dava liberdade porém a empresa ainda estava melhorando seus processos e era desorganizada em alguns momentos. Isso mostra que você não está vendendo a melhor empresa do mundo. Ela não existe! Todas as empresas tem seus problemas, seja franco!
Abra o final da entrevista para o candidato tirar suas dúvidas, seja sobre a vaga em questão ou sobre processo seletivo. Alguns candidatos perguntam sobre sua performance na entrevista, isso é emblemático uma vez que é difícil dar um parecer positivo sem que o candidato acredite que passou. Nesses casos eu falo: Eu gostei da conversa porém a avaliação é feita em conjunto com outras pessoas. No caso oposto, tento mostrar os pontos que esperava mais conhecimento. Por exemplo: você poderia ter detalhado melhor o assunto Xpto, tive a impressão que talvez não tenha trabalhado com isso efetivamente.
Concluindo, a abordagem descontraída e personalizada nas entrevistas proporciona uma compreensão mais profunda dos candidatos. Ao desviar da formalidade, buscamos criar um ambiente propício para revelar o "verdadeiro eu" do indivíduo. A pesquisa prévia e a adaptação do roteiro conforme a história profissional são fundamentais, destacando a importância de orientar as perguntas técnicas com base nessa trajetória. Além disso, a fase de "ice-breaker" e a oportunidade de venda da empresa são cruciais para tornar a experiência positiva, transformando a entrevista em uma valiosa oportunidade de aprendizado mútuo.