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Documentação de Software: Uma Introdução e Tutorial

A documentação de software é frequentemente vista como uma tarefa árdua e, muitas vezes, negligenciada no processo de desenvolvimento. No entanto, sua importância não deve ser subestimada.

A Importância da Documentação

A falta de documentação precisa é a pricipal razão para o estado insatisfatório do desenvolvimento de software. A documentação não é apenas um complemento; ela é fundamental para:

  • Comunicação Eficiente: Comunicação entre desenvolvedores, gerentes de projeto, designers, usuários e quaisquer outros interessados.
  • Manutenção e Evolução: Processo de manutenção e atualização do software ao longo de gerações.
  • Qualidade e Confiabilidade: Identificação de inconsistências e discrepância entre o que deveria ser implementado e o que de fato foi.
  • Reuso de Designs Antigos: Reutilização eficiente de componentes e designs previamente desenvolvidos.
  • Testes e Inspeções: Criação de casos de teste eficazes e guiar as inspeções de código.
  • Gestão de Linhas de Produto: Gestão eficiente de diferentes versões e variantes de um mesmo produto de software.

Programação vs. Engenharia de Software

A documentação desempenha um papel central no engenharia de software, servindo como um guia detalhado para todas os interessados. É crucial diferenciar:

  • Programação: Envolve a escrita de código para resolver problemas específicos sem considerar o contexto mais amplo.
  • Engenharia de Software: É um processo abrangente que inclui além da programação, planejamento, arquitetura, design e documentação, visando a criação de sistemas de software sustentáveis e escaláveis.

Enquanto a programação pode ser vista como uma atividade isolada focada na implementação de funcionalidades, a engenharia de software abrange a visão completa do sistema, incluindo como diferentes componentes interagem e como o software evoluirá ao longo do tempo. Nesse contexto, a documentação desempenha um papel central, servindo como um guia detalhado para todas as partes interessadas e facilitando a colaboração eficaz.

Aprendendo com Sistemas Críticos

Em sistemas críticos, como aplicações militares, aeroespaciais, médicas ou nucleares, a documentação rigorosa é imprescindível. De fato, a maior diferença entre um software crítico e uma aplicação qualquer não está no código; a grande diferença é exatamente o rigor da documentação. E, claro, nenhuma aplicação não crítica deveria seguir os rigores de um software aeronáutico ou nuclear, mas ainda assim, não se engane: há muito o que se pode aprender com o processo de documentação desses sistemas. O MIL-STD-498 é um excelente exemplo. Esse padrão define uma série de documentos essenciais que estruturam o processo de desenvolvimento de software.

Embora tenha sido oficialmente deprecated, o MIL-STD-498 serviu como base para padrões modernos amplamente utilizados. Ele influenciou diretamente o IEEE 12207, que é o padrão internacional para o ciclo de vida de software. Além disso, o seu legado pode ser visto em frameworks e guias de boas práticas como o PMBOK (Project Management Body of Knowledge) e nas diretrizes da INCOSE (International Council on Systems Engineering). Ou seja mesmo sendo considerado "cancelado" e "antigo", o MIL-STD-498 continua compatível com as tendências mais recentes no engenharia de software.

Tipos de Documentos e Quando Produzi-los

Os modelos do MIL-STD-498 são uma excelente referência e ponto de partida. Podendo ser ajustado conforme a necessidade e complexidade do projeto. Abaixo, um guia geral para os principais documentos que qualquer produto de software deveria ter:

  1. Fase de Cotação (Request For Quotation)
  • OCD (Operational Concept Description): Documento inicial que descreve em linguagem clara o sistema em linhas gerais.
  • SDP (Software Development Plan): Descreve o processo de desenvolvimento, ferramentas (stack), cronograma e práticas de gestão.
  1. Projeto do Sistema (Design)
  • SRS (Software Requirements Specification): Definem os requisitos do sistema, incluindo o comportamento esperado e as funcionalidades.
  1. Desenvolvimento (Development)
  • SDD (Software Design Description) e IDD (Interface Design Description): Documentam o design e arquiterua do software, incluindo as interfaces ou a comunicação entre os componentes.
  • STD (Software Test Description): Define os casos testes a serem executados com as entradas e resultados esperados, alinhados com os requisitos do SRS.
  1. Entrega (Delivery)
  • STR (Software Test Report): Documenta os resultados dos testes realizados evidenciando que o software atende aos requisitos corretamente.
  • SUM (Software User Manual): Manual de usuário que descreve como utilizar o software.

Muitas vezes, essas fases de desenvolvimento ocorrem de forma paralela, especialmente em ambientes ágeis ou de desenvolvimento iterativo e tá tudo bem. O que não está tudo bem é não documentar o software.

Integrando a Documentação nas Metodologias Ágeis

As metodologias ágeis têm sido amplamente adotadas por promoverem flexibilidade e colaboração contínua. No entanto, elas também têm sido amplamente criticadas por desvalorizarem a documentação. A solução para esse dilema é focar na documentação como parte integrante do processo ágil:

  • Documentação Colaborativa: A documentação uma responsabilidade compartilhada e acessível a toda a equipe.
  • Documentação Contínua: Adote a prática de atualizar documentos à medida que o projeto evolui, em vez de deixar para o final.
  • Documentar como tarefa: Inclua tarefas de documentação no planejamento das sprints para garantir que não sejam negligenciadas.

Dicas Gerais para uma Documentação de Software Eficaz

  1. Pense na Documentação como Antecipação, Não deixe para depois.
    A documentação deve ser pensada desde o início do projeto, como parte integrante do processo de desenvolvimento. Não espere até o final para documentar o que foi feito. Documentar ao longo do caminho melhora a precisão e ajuda a identificar falhas antes de se tornarem grandes problemas.

  2. Seja Preciso e Organizado
    Documentos vagos e sem estrutura podem ser piores do que não ter documentação. A precisão é essencial. Os documentos devem conter informações claras, verdadeiras e organizadas de forma que qualquer membro da equipe possa consultá-las com facilidade.

  3. Diferencie Entre Documentos de Referência e Tutoriais
    Os documentos de referência são destinados a desenvolvedores e engenheiros que já possuem conhecimento técnico e precisam de detalhes específicos sobre uma parte do sistema. Já os tutoriais são mais narrativos, destinados a iniciantes. Cada tipo de documento deve ser escrito com seu público em mente, evitando confusão.

  4. Não Confunda Código com Documentação
    Por mais bem-escrito que seja o código, ele nunca substitui a documentação. O código pode mostrar o que software de fato faz, mas é simplemente incapaz de expressar o que o software deveria fazer. Comentários no código, são para clarificar trechos de código difíceis de entender, não para definir requisitos, comportamentos esperados ou decisões de design

  5. Cada Documento Tem seu Propósito e Deve Ser Completo Dentro de Seu Escopo
    Documentos como o SRS ou o SDD não precisam cobrir todos os aspectos do sistema, mas devem ser completos dentro do seu escopo.

  6. Gerencie Interfaces de Forma Rigorosa
    Interfaces entre componentes são uma área crítica que, se mal documentada, pode resultar em dificuldades de integração e manutenção. Descreva interfaces com detalhes e separe claramente o que é necessário para que os componentes interajam corretamente.

  7. A Matemática Deve Estar Presente na Documentação
    Use tabelas e expressões matemáticas, quando aplicável, para descrever comportamentos complexos de forma precisa. Desenvolver software sem matemática não é engenharia.

  8. Documentação Como Código
    Desenvolva à documentação com as mesmas ferramentas que o código-fonte. Isso inclui, no mínimo, texto plano, git e um sistema de build para gerar a documentação. O fundamental é que a documentação "viva" junto com o código.

Conclusão

A documentação de software, muitas vezes subestimada ou vista como uma tarefa secundária, é na verdade um componente essencial para o sucesso de qualquer projeto de software. Ela é o elo que une desenvolvedores, gerentes, usuários e todos os envolvidos, assegurando que o conhecimento sobre o sistema seja claro, preciso e acessível. A documentação é uma forma de engenharia em si, uma ferramenta poderosa para garantir a qualidade, a manutenção e a evolução de sistemas complexos ao longo do tempo.

A mensagem final é clara: Documente cedo, documente sempre. Não se trata de burocracia, mas de garantir que o software seja construído de forma correta e sustentável. O código pode ser o que o software é, mas a documentação é o que ele deveria ser. E num futuro em que a IA pode automatizar todo processo de programação, a máxima do ágil que preza "software funcionando ao invés de documentação abrangente" pode estar prestes a ser invertida. Com a evolução dos sistemas de geração de código ter uma documentação abrangente pode se tornar o maior ativo de qualquer projeto.

Um abraço e bons estudos!

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Muito bom. Engenharia de software é aquela coisa que geralmente passamos por cima na faculdade, mas faz falta no mundo real de dev.

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Isso!! Era esse tipo de conteúdo que eu estava buscando. Precisamos falar mais sobre isso, porque é um conhecimento pouco difundido. Sobre como fazer, os processos até chegar ao resultado final/desejado e etc

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